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BUENOS AIRES Mantendo sua história intacta sob a arquitetura importada, seus parques impecáveis e suas noites agitadas, Buenos Aires está aí do lado. Que tal ir tomar um cafezinho na casa da vizinha? Vizinho é tudo igual. Briga por causa do muro, por causa da bola que caiu no quintal. E ainda sempre acha que a grama do outro é mais verde. Nossa vizinha Buenos Aires não é diferente. Nós temos samba, ela tem tango. Nós temos o Amazonas, ela tem o Rio da Prata. Carlos Gardel mostrou ao mundo que a melancolia portenha podia dar samba. Carmen Miranda era portuguesa. E Gardel...Reclamar da vida, por exemplo. Mais precisamente desde que a cidade foi "invadida" por uma gente estranha que veio da Europa. A frase, aliás, é de Enrique Santos Discépolo, um napolitano que como tantos outros chegou à cidade no final de 1800 e que acabou se tornando uma das maiores personalidades da velha-guarda do tango - e, mais tarde, nome de uma ruazinha de 200 metros, travessa da Corrientes, que até hoje só aparece nos mapas mais completos. Ir dos bairros até a rua que hoje leva seu nome era uma viagem a ser programada com antecedência. Ficar babando pelas casas dos barões do gado na Florida, hoje a movimentada rua de lojas chiques do centro, era coisa de pobre. Exagerado, seu figurino era cinematográfico: a calça gaúcha, cinto largo e a echarpe casualmente largada em um dos ombros, para ventilar a fumaça do cigarro ou para cortejar as mulheres. Os bairros foram o berço do tango, ou melhor, os prostíbulos dos bairros, onde todo mundo ia. Ao mesmo tempo em que, com o lucro proveniente de suas grandes fazendas, importava arquitetos europeus para fazer da cidade a sucursal latino-americana da Europa. O Palácio do Congresso, por exemplo, leva a assinatura do italiano Víctor Meano. Acabou virando nome de rua. Evita passou fome e percorreu camas influentes até chegar, aos 25 anos, nos braços do cobiçado coronel Juan Domingo Perón e se tornar, em 1946, a primeira- dama do país àquela altura mais aristocrático da América Latina. Seja nas animadas discussões históricas que a população adora travar num café qualquer, seja na última mania buenairense: reciclar construções antigas. Nos velhos espaços de arquitetura art déco ou art nouveau remanescentes da época da velha-guarda do tango estão surgindo os novos templos de consumo da cidade. No número 750 da Rua Florida, o prédio construído em 1889 e que já abrigou escritórios da então próspera companhia ferroviária da cidade foi, por exemplo, transformado na nova e concorrida Galerías Pacífico. Também o primeiro shopping reciclado na Buenos Aires dos anos 90 - o Patio Bullrich, por sinal o mais sofisticado da cidade - ocupa um edifício centenário que foi uma importante casa de leilões rurais da cidade. Já no bairro de Belgrano, que no começo do século reunia fábricas e estábulos, fica o El Solar de la Abadía, pequeno e simpático centro de compras, construído em uma antiga fábrica recuperada. O único shopping que realmente tem cara de shopping é o Alto Palermo: ele é enorme e completamente distoante em relação à arquitetura da cidade. Como é o caso dos arcos da antiga linha de trem San Martín, em Palermo, hoje o Paseo de La Infanta, com noites agitadas, rapazes de camisas listradas e mocinhas louras. Um convento do século 18, que virou asilo de mendigos no século 19, e cartão-postal do todo cheio de pose bairro da Recoleta, dá lugar ao Centro Cultural da Recoleta, com galerias de arte, ateliers, um auditório e vários restaurantes. Nem as docas do porto escaparam. A verdade é que na casa da vizinha as coisas demoram a mudar, da mesma forma que as pessoas levam séculos para morrer. O corpo de Evita, ou somente "El Cadaver", transformou-se no mais viajado da História. Em 1970, o general Pedro Aramburu, autor do golpe militar, foi seqüestrado e morto justamente por não saber onde estava Evita. Somente após muita investigação recuperaram o cadáver, que foi deixado no jardim da casa de Perón, então exilado na Espanha. Finalmente, anos depois, o corpo voltou à Argentina, onde está agora, no túmulo da família Duarte, no cemitério da Recoleta. Enquanto "El Cadaver" perambulava pelo mundo, outro portenho famoso conquistava o planeta. Era Astor Piazzolla, o polêmico, bombástico e indolente revolucionador do tango - justamente por isso execrado pelos tangueiros tradicionais. Tanto que conquistou toda a vizinhança e em Buenos Aires não virou nome de rua, nem sequer souvenir. O fato é que Madonna vai ser Evita no cinema e ponto. Uma geração que cresceu na ditadura vendo as mães da Praça de Mayo chorarem e que, se não teve o gostinho de morar no país mais rico da América Latina, pelo menos curtiu o futebol de Maradona e ganhou duas (das nossas!) Copas do Mundo. Voltando à Madonna, ela deve ter adorado o pique de Buenos Aires. À uma hora de sábado o povo sai e as danceterias chiques da Costaneira Norte só pegam fogo lá pelas 4 horas. Cada um na sua. No Café Victoria, na Recoleta, a idade média dos freqüentadores beira os 70. Nas cantinas italianas do bairro portuário de La Boca, é comum ver criancinhas de 10 anos mais acordadas que os pais. À meia-noite tem criança de colo na rua. Na hora do almoço, engravatados e executivas comem marmita nas praças e casais de namorados rolam na grama da Praça San Martín. Aliás as praças e os parques de Buenos Aires são a praia deles. Qualquer sol já basta para as mulheres tirarem o biquíni do armário e virarem siris na grama do Parque de Palermo. O fim de tarde é a hora dos cafés, estrategicamente plantados por todos os lados. O consumo do cafezito na Argentina é algo impressionante. Toma-se mais café do que cerveja. E em grande estilo. No preço, que varia de 2 a 3 dólares, vem embutido o direito de ficar sentado o tempo que quiser na mesa. Apesar de eles estarem reclamando da violência (mais uma queixa), a cidade é um jardim do Éden para qualquer brasileiro de cidade grande. A cidade está infestada desses veículos da década de 80 pintados de amarelo e preto. Na direção, muitos profissionais liberais ejetados do mercado devido à crise financeira. Uma opção bem mais sanguinolenta pode ser as mollejas: a jugular do boi. No próprio Caminito, você pode encontrar caminitos que não acabam mais. Todos feitos pelos artistas do bairro. Na feirinha de antigüidades de San Telmo tem de tudo. Um disco de tango da década de 30 sai por 10 pesos. reserve uma manhã para percorrer a pé o centro da cidade. Comece pela Praça San Martín. Entre na Rua Florida. Vire à direita e dê um pulinho ao Teatro Colón. Volte em direção ao Obelisco e vire à esquerda na Avenida de Mayo. No número 826 fica o Café Tortoni, onde você pode pedir uma merengada, uma espécie de sorvete que é a especialidade da casa (5,5 pesos) para segurar a fome até o almoço. Continuando na Avenida de Mayo, você vai chegar na Praça de Mayo, onde fica a Casa Rosada, sede do governo, o Cabildo, palco da revolução de maio de 1810, e a Pirâmide de Mayo. Contornando a praça, chega-se à Costaneira, avenida que beira o Rio da Prata. Pare para almoçar em Puerto Madero, as recém-reformadas docas do porto, onde há diversos restaurantes e uma bela vista do rio. Depois do almoço, faça um tour rápido pelo resto da cidade. Depois vá ao bairro de San Telmo, onde aos domingos há uma feira de antigüidades na Praça Dorrego, das 10h00 às 18h30. Depois vá à Praça del Congreso. Acabe a tarde na Recoleta. Visite o Centro Cultural e o cemitério, e tome um café no La Biela (US$ 3). À noite, assista ao show de tango do Tango Mío (Ituzaingó, 1200). Vá descansar no Parque de Palermo pela manhã. Palermo Chico é o pequeno setor de grandes mansões do século 19. Palermo Viejo, adotado recentemente pela nova safra boêmia, é o local de agito do bairro. No caminho de Palermo para Belgrano, pare para almoçar no La Cuadra (Jorge Newberry, 1651), um estábulo transformado em restaurante, que, segundo o dono, chegou a guardar o cavalo de Gardel. Depois, vá até a Praça Manuel Belgrano, o centro do bairro da classe média alta portenha. Em seguida, pelo Museu Histórico Domingo F. Sarmiento, cujo prédio, construído em 1870 e que chegou a ser sede do governo, já vale a visita. De lá pegue um táxi para a Costaneira Norte, a avenida do aeroporto central, das churrascarias, dos clubes e danceterias. Pare no Happening (às sextas e sábados, reservas pelo tel. Para fazer a digestão, se for sexta ou sábado, dance na El Cielo (na travessa da Sarmiento), onde talvez você encontre o Maradona. Vá beirando o Riachuelo, rio que desemboca no Rio da Prata, até a ponte férrea. Depois ande até o estádio do Boca Juniors, conhecido como "La Bombonera". Ao lado do estádio fica a tradicional Cantina La Cancha, com ótimos mariscos e pasta. Reserve a tarde para conhecer melhor o bairro de San Telmo, um dos mais antigos da cidade. Comece da Praça Dorrego. Aos domingos é lá que acontece a feira de antigüidades, mas também há várias lojas de antigüidades ao redor da praça inteira. Vá andando pela Rua Defensa até a Pasaje San Lorenzo, uma interessante ruela colonial que acaba na Faculdade de Engenharia. No caminho, passa-se pelo antigo mercado, por vários conventillos, casas colonias que, na época da chegada dos imigrantes, abrigavam várias famílias ao mesmo tempo. Mais à frente chega-se ao Museu da Cidade e, ainda, à Farmácia de La Estrella, um museu farmacológico com tudo exatamente igual ao que era no século 19. À noite, passeie pela Avenida Corrientes. Ande pela praça, vá a Igreja do Pilar, volte ao Centro Cultural e entre no cemitério para visitar o túmulo de Evita. Tome um sorvete da Freddo. Entre na aristocrática Avenida Alvear, onde estão os mais luxuosos palácios da cidade. Ela acaba na Praça Carlos Pellegrino, onde fica a Embaixada do Brasil, que, como a maioria dos outros palácios, foi construída por um arquiteto francês. Almoce no El Mirasol (Posadas, 1032), que oferece um magnífico filé ao champingnon. Aproveite a tarde para passear na parte moderna da cidade, o complexo Catalinas, com torres envidraçadas de multinacionais, próximo à Praça San Martín. À noite, coma uma pizza no Filo (San Martín, 975), lugar de descolados onde sempre aparece uma festa maluca para continuar pela madrugada. Vá até o elegante bairro de Olivos, onde fica a casa do presidente, e, na Avenida Maipú, embarque no Trem de La Costa (o bilhete custa 1,5 peso). O início do outono é a época dos dias ensolarados e céu azul. Na maioria dos lugares o dólar funciona como moeda corrente. A cidade muda nesses dois dias. Alugar um carro em Buenos Aires não é uma boa idéia. O trânsito é um inferno e a locação é cara (a diária do carro mais barato custa US$ 80). Um táxi do centro da cidade até a Recoleta custa US$ 3. E não tem jeito melhor de se locomover lá do que a pé. Dessa forma também é possível percorrer todo o centro da cidade. O outono em Buenos Aires é fresquinho e à noite pode fazer frio. Há várias lojas Havana espalhadas pela cidade, uma delas dentro da Galerias Pacífico (Rua Florida, 750, 311-6323 ou 311-6324). Borges Jorge Luis Borges (1899-1986) foi um dos maiores renovadores da literatura hispano-americana e certamente o maior escritor argentino de todos os tempos. No Centro Cultural Borges, no último andar da Galerias Pacífico, há salas para eventos e projeção de filmes e uma mostra permanente de manuscritos, fotos e objetos do autor de Aleph. Cafés É nos cafés que Buenos Aires mais se parece com a capital francesa. Os melhores lugares para sentir esse lado parisiense de Buenos Aires estão no bairro da Recoleta. Mais precisamente, numa esquina da Av. Quintana. No número 600 fica o La Biela (804-0016), e exatamente do outro lado da rua está o Café de La Paix (804-6820). No número 1086 da Comentes, o Café Pernambuco é freqüentado por gente de artes plásticas e teatro. Não deixe também de conhecer o Florida Garden (florida com Paraguay), o preferido dos jornalistas e do pessoal da tevê. Lá, experimente a famosa mousse de chocolate. Danceterias As mais badaladas ficam na Av. Costaneira Norte. Para ver celebridades, vá ao Mau Mau (na curva da Rua Arroyo). Evita Para entender como a eterna rainha dos descamisados é idolatrada pelos portenhos, não há coisa melhor do que passear pelo cemitério da Recoleta num domingo. Deu para entender por que a Madonna encarnando Evita gerou tanta polêmica? Futebol O futebol argentino é o grande rival do brasileiro na América do Sul e já foi campeão do mundo por duas vezes. O Boca, que projetou Maradona e foi seu último time, é o clube mais popular do país. Seu estádio, conhecido como La Bombonera, fica no bairro portuário de La Boca. Já o estádio do River, batizado, sem modéstia nenhuma, de Monumental, é o maior do país e fica num bairro chique da zona norte, a mais endinheirada da cidade. Nem precisa dizer que é o time da burguesia. O edifício de número 750 da frenética Calle Florida, construído em 1889, foi reciclado no início desta década e seus maravilhosos afrescos seculares convivem com lojas elegantes. É um endereço obrigatório para as compras, mas a cidade oferece também os armazéns reformados de Puerto Madero, à beira do Rio da Prata, e o sofisticado Patio Bullrich (Av. Libertador, 750, 815-3501). Italianos Os imigrantes italianos chegaram a Buenos Aires no começo do século, concentrando-se no bairro portuário de La Boca. As grandes atrações de La Boca são o Caminito, ruela imortalizada por letras de antigos tangos, e suas animadas cantinas ao longo da Av. Necochea. Anote algumas: La Cueva de Zingarella (Necochea com Olavarria), Spadavecchia Necoche, 1180) e II Picolo Vapore (Necochea, a 190, 301-4455. A melhor cozinha italiana, porém, não está em La Boca: são a do Robertino e suas receitas do norte da Itália (Rua Vicente López, 2 158), a Mamma Liberata (Rua Maipu, 642 e Rua Medrano, 974) e o Broccolino (Rua Esmeralda, 776, 322-7754). Um dos melhores clubes de jazz da cidade é o Satchmo (Aguero, 2279), em Alto Palenno. No Oliverio Allways (Callao, 360, 372-6906) a programação de boa qualidade muda quase que diariamente. Livrarias e sebos Os portenhos adoram falar que só a Av. Comentes tem mais livrarias do que o Brasil inteiro. Museus e teatros Um programa cultural imperdível na cidade é assistir a um concerto no Teatro Colón. O prédio em estilo neoclássico tem capacidade para 3 200 pessoas e uma das melhores acústicas do planeta. As entradas são vendidas nas bilheterias laterais (Rua Arturo Toscanini, 382-5414) no dia anterior ao espetáculo, das 10h às 20h. Noite Você já deve ter ouvido muito a respeito da agitada vida noturna portenha. Hora de jantar em Buenos Aires é depois das 10h. Hora de sair é para lá das 11h. Aproveite! Obelisco O Obelisco da Av. 9 de Julho é o cartão-postal mais conhecido de Buenos Aires. O monumento de 68 metros foi construído em 1936, em comemoração ao quarto centenário da cidade. Ele marca o ponto central da Av. 9 de Julho, considerada a mais larga do mundo, com 140 metros. Comer carne é um dos hábitos mais arraigados na cultura argentina. Um dos lugares mais tradicionais é o Restaurante La Cabaña (381-2373), que serve um dos melhores bifes de chorizo - o nosso contrafilé - da cidade. As verdadeiras "bocas" de roupas ficam nas lojas de fábrica da Comentes com a Pueyrredón. As fábricas de couro e peles aglomeram-se no quarteirão da Suipacha com a Paraguai, também no centro, e nas avenidas Santa Fé e Cabildo. Tango Há casas de tango que mostram a dança no palco e incluem um jantar no pacote. O verdadeiro tango rola nos ambientes enfumaçados e decadentes do La Media Luz (Chile, 316, 331-1872), Café Homero (J. A. Cabrera, 4946, 773-1979), Bar Sur (Balcarce e Estados Unidos, 362-6086) e La Ventana (Balcarce, 425, 331-0217). Uniforme Buenos Aires é européia até na maneira de vestir. As mulheres, esguias e longilíneas, desfilam griffes famosas e carregam na maquiagem. Se você for sair à noite, então, dependendo do lugar, esqueça a dupla calça jeans e tênis. Em várias danceterias, principalmente na Costaneira, há leões-de-chácara na porta para barrar quem não está vestido à altura. A argentina é uma das maiores produtoras de vinhos do mundo e tem, a cada ano, aprimorado a qualidade. Os vinhos da região de Mendoza, centro-oeste do país, são especialmente bons. Xepa nas feiras A mais conhecida feira permanente de Buenos Aires é a de San Telmo. Ela acontece aos domingos, das 10h às l7h, na Praça Dorrego, coração do bairro de San Telmo. No Caminito, em La Boca, vários artistas expõem seus trabalhos ao ar livre. Zorzal El Zorzal - o sabiá, em espanhol - era o apelido carinhoso do portenho para Carlos Gardel, o maior cantor de tangos da história. Em parceria com Alfredo la Pera, Gardel compôs clássicos como El dia que me Queiras e Mi Buenos Aires Querido e levou o tango para o mundo inteiro. O túmulo de Gardel no Cemitério da Chacarita vive cheio de flores e a estátua do tangueiro em tamanho natural é sempre reabastecida com um cigarro aceso encaixado na mão direita.
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